quarta-feira, 4 de setembro de 2019

SÓ VIVE QUEM PERDOA (UMA HISTÓRIA SOBRE PERDÃO)

“José, porém, lhes disse:

 "Não tenham medo. Estaria eu no lugar de Deus?

Vocês planejaram o mal contra mim, mas Deus o tornou em bem, para que hoje fosse preservada a vida de muitos. Por isso, não tenham medo. Eu sustentarei vocês e seus filhos".

E assim os tranquilizou e lhes falou amavelmente. ”

(Gênesis 50:19-21)

As narrativas sobre José do Egito são impressionantes. Todos lembram do sonhador, décimo primeiro filho de Jacó com a sua amada Raquel. Que foi vendido como escravo pelos seus irmãos, sofreu acusação injusta na casa do general do exército egípcio, foi esquecido na prisão por um companheiro e de como Deus agiu em seu favor.

Quando lemos essa história, somos impactados com a serenidade, firmeza e fé de José. No texto citado acima, está a impressionante lição que José dá aos seus irmãos e a todos nós. Esse é o fim que sonhamos ter em todos os nossos problemas de relacionamentos.

Mas a pergunta que cabe aqui é: O que aconteceu na vida de José que permitiu tamanha ternura e compaixão?

José perdoou.

John Mayra Donne foi um poeta e pregador inglês que, sobre os afetos, nos alertou:

"Que nossos afetos não nos matem nem morram".

Os mesmos afetos que geram vida em nós podem morrer, e pior, podem nos matar. As decepções e desilusões da vida têm o poder de converter corações amáveis em terrenos inférteis e pedregosos.  Porém, o perdão é o ambiente onde a cura dos afetos feridos acontecem. Perdoar é dá ao outro a condição de se redimir, se arrepender e, sobretudo, nos dá também a condição de não nos tornar uma pessoa amargurada, fria e insensível.

É o perdão que nos ajuda a não confundir justiça com vingança.

Existem alguns detalhes na história de José que podem nos ensinar sobre essa preciosa e importante experiência de perdoar.

- PRIMEIRO, PERDOAR DEMANDA TEMPO

Temos a tendência de romantizar as histórias e personagens bíblicos. Olhamos para eles e, na maioria das vezes, não conseguimos perceber a dor, angustia e, principalmente, o tempo que cada situação, crise e luta demandam.

As narrativas sobre a vida de José começam no capítulo 37 do Gênesis e vai até o final do livro. A história tem início quando ele tinha dezessete anos (37.2), quando foi reconhecido e honrado pelo faraó, José tinha trinta (41.46) e quando se revelou ao seu irmão tinha, mais ou menos, trinta e dois (baseado na informação em 45.11).
Sendo assim,desde a traição sofrida até o reencontro com os irmãos se passaram quinze anos.

Em quinze anos, José teve a oportunidade de pensar, orar, administrar e tratar suas emoções. E isso nos ensina que o perdão demanda tempo. Talvez não quinze anos, até mesmo porque acredito que José não demorou esse tempo todo para perdoa-los. Mas a verdade é que não devemos minimizar as dores causadas por uma traição, ofensa ou agressão. Entre o desejo de perdoar e a cura das feridas há um tempo que precisa ser respeitado. É importante que tenha um dia para terminar, é verdade. Mas precisa ser considerado o tempo necessário para que o genuíno perdão aconteça.

- SEGUNDO, PERDOAR LIVRA DA AMARGURA

Um coração amargurado não perdoa. E mais ainda, um coração que carrega o peso do mal que alguém lhe fez se torna, aos poucos, mal também. A definição de amargura é: “Sofrimento forte de dor, tristeza e desencanto”.

A maldade tem, ao menos, duas faces. Tem a maldade do ato em si, quando uma pessoa faz o mal contra a nós. Porém, existe também a maldade que causamos a nós mesmos, quando permitimos que as experiências ruins afetem a forma como nos relacionamos com os outros, com nós mesmos e como reagimos ou deixamos de reagir aos estímulos da vida.

Na carta aos Hebreus, o autor escreve:

“Esforcem-se para viver em paz com todos e para serem santos; sem santidade ninguém verá o Senhor. Cuidem que ninguém se exclua da graça de Deus. Que nenhuma raiz de amargura brote e cause perturbação, contaminando a muitos. ” (Hebreus 12:14,15).

Das orientações que o autor nos oferece, ele pontua: “Que nenhuma raiz de amargura brote e cause perturbação, contaminando a muitos. ” . Um coração amargurado causa perturbações.

José se livrou da amargura. Não permitiu que o mal que fizeram com ele o tornasse mal também. Três episódios da sua vida mostram isso. O primeiro é a sua fidelidade na casa de Potifar. Ele poderia justificar o erro com a maldade de sofreu. Aliás, temos a tendência de fazer isso. Justificamos a grosseria, o mal humor, a falta de atenção, o descaso, a dificuldade de demostrar e receber afeto, a infidelidade pelos erros dos outros. Porque ele fez, eu fiz também, dizemos. Mas quando fazemos isso, estamos permitindo que a amargura nos torne pessoas más.

O segundo episódio acontece na cadeia. José foi preso injustamente. A injustiça desperta em nós sentimentos de raiva, tristeza e desencanto. Essas coisas tendem a tronar amargo o mais alegre dos corações. Mas, mesmo diante dessa situação José não deixou de fazer o bem. E por fim, diante dos seus irmãos. José, por perdoar, se livrou de ser perverso como foi os seus irmãos.

- TERCEIRO, PERDOAR É CONFIAR EM DEUS

 “Estaria eu no lugar de Deus?” foi essa pergunta que José fez aos seus irmão.

Quando perdoamos deixamos que Deus julgue a situação. Paulo, ensinando como devemos vencer o mal, cita a Lei:

“Amados, nunca procurem vingar-se, mas deixem com Deus a ira, pois está escrito: "Minha é a vingança; eu retribuirei", diz o Senhor.”  E continua: “Pelo contrário: "Se o seu inimigo tiver fome, dê-lhe de comer; se tiver sede, dê-lhe de beber. Fazendo isso, você amontoará brasas vivas sobre a cabeça dele. Não se deixem vencer pelo mal, mas vençam o mal com o bem.” (Romanos 12:19-21).

Perdoar, antes de ser um bem feito ao outro, é um bem feito a nós mesmo. Quando deixamos que Deus cuide, Ele primeiro cuida de nós, não permitindo que o mal nos afete e depois Ele trata com quem nos feriu. A forma correta e eficaz de destruir o poder do mal que alguém nos fez é perdoando. Assim, os nossos afetos são curados e estaremos prontos e oferecer os mais nobres e puros afetos.





Lázaro Sodré 

(Pastor da Igreja Batista Alvorada, Aju - SE) 

Esse texto faz parte das pastorais dominicais, na ocasião do mês da família (Maio de 2019) -


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